domingo, 6 de março de 2011

antiquário

A verdade é que raramente desaba
na minha cabeça um poema pronto

escrito por duendes verdes
ou entes quaisquer doutro mundo.

As palavras não são fáceis.
Elas não gostam de mim.

Da minha pele.
Do meu cheiro.

Elas trancam-se diante dos meus olhos
às vezes tenho medo de bater à porta.

Algumas [por piedade]
afrouxam o trinco.

E dizem "seja rápido"
Acabo escrevendo tolices.

Um olho no teclado
e o outro na porta.

[por exemplo, agora
vejo uma fila indiana
todas elas em fuga]

Digam-me como escrever dessa forma:
dispensado por quem deveria me estender as mãos.

As palavras não são fáceis.
Não me oferecem nem mãos
nem nádegas nem axilas.

Não gostam da minha presença.
Da minha voracidade e da minha fome.

[por exemplo, agora
elas erguem suas lanças
e protegem-se com seus escudos
sob tática espartana]

Digam-me como vencê-las.
Elas aprenderam com Leônidas
a nunca se curvarem diante de um louco.

Elas odeiam a minha loucura.
Não gostam de mim nem um pouco.

Nem mesmo neste exato momento
em que vizinhos bêbados derrubam
pratos e copos

elas me permitem chegar próximo
confessar-lhes a minha vida

os meus erros gramaticais
a minha solidão efêmera.

As palavras não são fáceis.
Não me ouvem.

Dão rabissacas.
Somem pela área de serviço.

Não vou atrás delas.
Também não sou fácil.

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