sexta-feira, 31 de julho de 2015

O amor me desgasta.
Crio correntes pela casa.
E a chuva inesperada me deixa
Meio bolado como se deus me amasse.

Não será uma cidade esperta
(Sob luzes espertas e metrôs espertos
E restaurantes espertos e shows espertos)

Que te fará alguém esperto.

A sedução das palavras
É um negócio bem íntimo.

Man.

Não se apresse, poeta.
Um dia você morre.

E a sua poesia
Não ficará
Órfã.

Pois cada irmão e irmã
Que lerem um poema seu
Você logo dará sinal de vida
Movendo o seu dedo mindinho.

Ainda que
Só ossinho.
Nunca fui bom em paquerar.
Na adolescência, ao tentar
Modificar os olhos pra
Seduzir uma ninfa
Fiquei três dias
Zarolho.

Ou quando ousava
Andar altivo com charme
As meninas gritavam da praça:
"Olha o espantalho sem cabeça!"

Resolvi, então, aos dezessete anos
Fazer alquimia e escrever versos
No sótão de William Blake.

Quem ama
Vive exposto.

Óbvio.

O homem da caverna apaixonado
(Ao caçar) era agredido com
Pedras e paus secos.

Aos românticos de Florença
Chuva de repolhos podres.

Fato histórico.

Portanto, meu filho, não se aborreça
Com os trabalhos feitos na sua calçada.

Pule.

Não diga o meu nome em vão às suas boas amigas.
Nem profira lendas maledicentes sobre minha pessoa.

Podem as suas amigas
Acordar um dia curiosas.

Bater à porta
E pedir uma ajuda
Com a mangueira do gás.

Ou trocar lâmpada
Ou ajeitar o pé
Da mesa.

Você sabe que sou péssimo
Com essas coisas domésticas
De professor de física de férias.

Mas a depender da carência
Das suas amigas pode o santo
De Dom Quixote baixar e festins!

Festins!

Não diga o meu nome em vão às suas boas amigas.
Nem profira lendas maledicentes sobre minha pessoa.

Podem as suas amigas
Acordar um dia curiosas.

Bater à porta
E pedir uma ajuda
Com a mangueira do gás.

Ou trocar lâmpada
Ou ajeitar o pé
Da mesa.

Você sabe que sou péssimo
Com essas coisas domésticas
De professor de física de férias.

Mas a depender da carência
Das suas amigas pode o santo
De Dom Quixote baixar e festins!

Festins!
Ninguém tocará no que guardo silencioso.
Nem a palavra ousa macular minha lágrima.

O teu coração (há séculos e séculos) nasceu florido
Do suspiro de uma estrela cadente a cair no meu rosto.

A imagem contrária (o inverso da trama)
Não nos divide, aliás, sugere a mesma luz.

O encanto real não acorda a luz.
Os bons fantasmas não assustam.
A treva só é clarão aos corvos felizes.

As réstias, os feixes, os raios,
Coincidem a um mesmo canto
Da sala do meu abrigo de cela.

Os meus pés postam-se
Um sobre o outro esquentando
O que adivinham de frio nos teus.

A minha voz muda, treme rouca,
Quase inaudível aos pássaros
Das minhas oitis, ao cantar
O teu nome no banjo.
Uma gaveta emperrada
Pode nos levar à loucura.

O poema não.

Uma queimadura de óleo do ovo estrelado,
O cadarço que se parte na hora do laço,
A garrafa de água vazia na geladeira,
Tudo pode nos levar à loucura.

O poema não.

Nem o mais piromaníaco
Com cheiro de querosene
Em nossas mãos de girassol.

quinta-feira, 30 de julho de 2015

Olha só, baby,
Brinco com a xícara
Segurando-lhe a asinha

Como um senhor de engenho
Rodopia uma moeda na palma da mão.

Não é o máximo?

Banho meu corpo
Com o teu perfume
Pra ver se o coração
Acalma-se dessa febre.

O coração quer é a embriaguez
Dos teus poros (cada furinho
Da haste do pelo arrancado
Com os dentes).

E não negocia.

Esqueleto que se torna
Alma (das providências
Mais lindas da natureza).

Todos os seres vivos
Com que seus olhos
Encantem-se, saiba:

Esqueletos que se tornam
Almas (seu cão, seu gato,
Os seus avós e seu amor).

Livre-se das algemas
E não tenha esse medo
De apagar um ou outro poema.

Apague dois, três,
Quantos você entender
Que não foram sinceros
Com a sua dor e sua fúria.

Maquiar um cadáver
Não assusta quem
Conhece o frio
Do corpo.

Pessoalmente quando converso com alguém
E esqueço uma palavra, uma data, uma lembrança
Da infância que se perde entre os nevoeiros do instante,
Então sorrio no canto dos lábios, acaricio seus cabelos e beijo
A nuca da pessoa a fim de distraí-la para que ela não se assuste
Com um poeta ainda tão jovem senhor já com sinais de Alzheimer.



O poema não prescreve. Não existe uma data específica
A que depois o poema vire carvão e comida de traça
E acabe arquivo morto dentro de um armário cinza.

Escrito ou não, o poema não prescreve.
(Os autos estão sempre postos sobre a mesa)

E haverá o dia em que abrirá a porta
Do quarto, do baú, da gaveta, da tumba.

Baterá com os punhos dos seus dedos
No peito (no nosso peito de fantasma)
Fazendo aquele barulho seco.


Pensa que não estou ciente
De que você só vive comigo
Porque todas as manhãs
Aos primeiros cantos
Dos passarinhos

O poeta chega à cabeceira da sua cama
Com uma bandeja espetacular de suco,
Torradinhas, café, frutas, um buquê
E um poema?

Sei que poderia abrir a porta
Com as minhas pernas dar o fora
O crocodilo do fosso está amarrado
O cachorro feroz dormindo mas é uma fronteira
Perigosa aproximar-se da porta da sala: front de bombas,
Trincheira de gás mostarda e morro de medo do mundo lá fora.

E vou ficando ficando ficando
Debaixo dos seus cabelos
De avelã e seus cílios
De fios de ouro.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

O meu coração tem uma passagem
Por onde fogem os meus fantasmas.

A cada vida que flui
Deixam um bilhete
Para quem vier
Em seguida.

Os meus fantasmas
São muito atenciosos
Entre si e não somem
Sem escrever um verso.

Sacou até onde podem te levar as palavras?
E a tudo que elas dizem tu ainda te espantas.

Não é mediunidade,
Furor e doce de leite.

Segue.

A poesia é um barato
Só quando arde o meu coração
E me enlouquece: fora isso, um tédio.

Coisa de quem não tem
Um grande propósito
Na vida.

E vive por viver.
(Todos os segundos)

A entrada da atleta de nado sincronizado
E aquele rápido e encantador ritual antes
De cair na piscina: é o princípio do infarto.

Casaria.

Gosto da cor preta
Desde criancinha
Ao me apaixonar
Perdidamente
Por um corvo.

Que era
Graúna.

Já te disse que ela dançava
Em volta dos meus pés?

Mil vezes.

Escrever é bom ao coração.
(Desajusta as suas batidas)

Posso então andar em paz
Ciente do risco da parada.

Embora a minha cabeça
Confesse-me a real causa
Da minha morte: aneurisma.

Devo correr, e as palavras
Pegam as minhas mãos sem
Trégua e um pingo de piedade.

Procuro tuas digitais
Pelas minhas costas.

Como te condenar
Ao amor eterno
Sem o calor
Das tuas
Unhas?

Se não tivesse largado minha guitarra de lata de óleo pajeú
Nesta noite tocaria um blues debaixo da janela do meu amor.

Mas tive que vender limões
Ainda criancinha, baby.

(Juntar moedas pra revistas em quadrinhos)

Os teus cílios são fios de ouro
Que a aurora dourou um sol
Antes que meus olhos
Acordassem.

Hoje não pego
Em armas.

As minhas rosas após oferecerem
O que tinham para seduzir dizem-me adeus
Curvando a cabeça sem que caiam as pétalas.

Poderia sufocá-las mais um dia
Dentro do jarro de vidro e ouvi-las
Cantando seu blues de rosas vermelhas.

Não sou caçador do tipo
Que mata, decepa e empalha
Como troféu a alma do seu amor.

Durante cinco dias
Essas rosas lembraram-me
O seu batom todas as manhãs

E a cada caminhada até o riacho
Pra banhá-las, mudar a água e conversar
Fui um homem não feliz, mas desejoso de sê-lo.

Quase cheguei lá,
Ao poço do desfiladeiro.

Escrevi três cartas
Para o meu amor.

A primeira se resumia
A dizer em letras garrafais
O quanto morro de saudade.

A segunda um poema de Neruda.
A terceira tinha uma nódoa
De lágrima (e nenhuma
Palavra).

A que enviei.

terça-feira, 28 de julho de 2015

Às vezes, guardo um pedaço de poema
Enrolado pela manga do meu casaco
Como quem um dia viajará pra longe
E precisa de carne vermelha
Ou peixe.

Antigamente a antecâmara da minha poesia
Era a varanda (sentado na cadeira de vime
Bebendo um café) agora peguei gosto em
Lavar as louças do jantar na área
De serviço.

De lá, fogem os guerreiros de Xian
Com as suas túnicas de ouro
E flechas de luz.

Se você me visita
Com esse ar de febre
Descendo pelo seu rímel

Tento adivinhar as canções
Que você ouviu de Chico.

E beijá-la com lábios
De outra mulher.

Quando adoramos uma pessoa
A morrer de simpatia por seu orixá

Tudo que se vê é fabuloso
Tudo que se diz é extasiante
Tudo que se ouve é esplêndido

Tudo que o coração arde
É tão poético.

E não existe
Mentira.

Quando adoramos uma pessoa
Havemos de adorar como os pagãos
Adoram os seus deuses: com desespero.

segunda-feira, 27 de julho de 2015

A minha mão não é leve.
É lisa, mas não é leve.

Se chego a algum ponto de delicadeza no que escrevo,
Preciso antes de muita oração e jejum: e me iludo
Sob o requinte que se ilude um assassino
Bem treinado com a sua arma.

(Já troquei hoje
A água das
Rosas)
"Conquistar-te entre todos aqueles caras foi muito desgastante, querida."
Disse um louva-a-deus à sua amada fêmea que respondeu com um
Cigarro na boca:"Fazer amor contigo não foi nada que sonhei..."
E decepou-lhe a cabeça.

E a cabeçou rolou pelas folhas
Ainda com aquele sorriso
De apaixonado.

(Meio incrédulo
Com seu fim)

sábado, 25 de julho de 2015

O sagrado leva
À loucura ou
À guerra.

A poesia
Não é mais
Aquela outra vida.

Agora é trabalho.
Só um trabalho.

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Sabe aquele artesanato
De galinha de arame?

Pois bem, acabei
De rechear duas.

Em cada uma
Meia dúzia
De ovos.

Brancos em uma,
Vermelhos noutra.

Depois, lavei as mãos.
(Sabemos de onde
Vêm esses ovos)
Nunca esqueço do beija-flor
Que cruzou a porta da cozinha
E pousou na poncheira de vidro.

O meu dedo marcando a página do livro.
Os seus pezinhos firmes sobre a poncheira.

Saia de cena
Sem que o anjo
Toque trombeta.

E o demônio suspire
Nos furinhos da gaita.

Lembra dos apetrechos
Do sertanejo atrás da porta?

Leve na sua alma
Só aquela memória.

Tiro o meu cavalo da chuva
E dentro do estábulo trocamos
Uma ideia do tempo em que ele
Era um pégaso e o poeta um Sátiro.

(Foi bom)

Eis que chegou a hora
De plantarmos batatas.

O poeta a sujar as unhas de terra
E o meu cavalinho a puxar o arado.

No Alasca, conheci uma gaivota
Que me ensinou a língua dos peixes.

A lástima era que nunca conseguia hablar
Com os peixes, pois eles vinham sem cabeça.

Afinal, a cabeça
Era o banquete
Da gaivota.

Você não via, mas eu anotava no caderninho
A pausa dos seus suspiros, o fôlego da sua
Respiração, o som da sua clavícula.

No meu sótão, tarde da noite,
Experimentava a alquimia
Da sua alma.

O tempo que você levou a encantar o mortal
O poeta aprimorava-se entre as palavras,
Partituras, xícaras de café e óleos
Aromáticos do mar morto.

O nosso adeus, quando segui o caminho das nuvens
E você pegou aquele trem, não foi uma partida triste.

Em matéria
De saudades
Estamos quites.

E sempre será preciosa
(Soberana) a delicadeza.

Creio que hoje as árvores da minha calçada
Resolveram oferecer-me um banho
De suas folhas.

Troco as fronhas
Dos meus travesseiros
Sorrindo pras amigas oitis.

Deixo
O sofá
Colorido.

A lágrima dentro do meu olho não abre mão da sua intimidade.
Prefere morrer presa e sem escândalos a escorrer pelo rosto.

Entendo essa lágrima
E não pego guardanapo,
Lenço, papel de embrulhar
Pães e de presente de perfume.

Nem a flauta do fauno de sexta-feira
Tira de lá de dentro da saudade
Essa lágrima tão bacana.

A folha que cai,
O passarinho que canta
E se esconde entre os galhos,

Tal mágica não acontece sem
A vontade do silencioso Criador.

Então.

Os poemas que escrevo
Seguem a mesma fé, apenas
Que o Senhor dos passarinhos
E das árvores não pega minha mão.

Mantém um certo respeito
E distância razoável em que
Possa assistir aos meus delírios.

Essas coisas minhas de escrever versos
Assim mesmo, meu filho, não se assuste.

Você não imagina
O que os velhinhos

Arrastando os cilindros
De oxigênio pelos corredores
Do manicômio fazem pra respirar.

Você não imagina o vento frio
Que entra por aquele avental
Aberto na traseira.

Não, você não imagina
Aquele vento frio a queimar
Suas bolinhas tão azuis e lilases.

Os velhinhos dão pulos
De alegria quando
A enfermeira

Com as mãos gordas e gordurosas
Grita pelos corredores do manicômio
Que é hora da massagem nas bolinhas.

Shirley Mclaine. O nome da senhora. Eu bebia feito um gambá sentado no batente do saloon do mexicano. Bebia por meu irmão xerife morto pelos miseráveis assassinos os irmãos Buddy. Bebia pela nevasca que me triturava os ossos. Bebia pela fazenda em ruínas. Bebia pela má sorte da minha alma. Bebia o whisky de comanche do miserável mexicano. Bebia feito um gambá quando a senhora Shirley Mclaine passou por mim. Sorriu com um sorriso de marfim amarelo. Entrou no saloon do miserável mexicano. A nevasca queimava meus rins. Não queria entrar no saloon. Shirley Maclaine entrou. Entrei. A senhora sentada na mesa do Juiz Tonny Law e do reverendo Still sorria escandalosa mostrando como tesouro aqueles dentes de marfim amarelo. Era amor o que sentia. Dei um tiro no Juiz Law e outro no reverendo Still. Puxei a senhora Shirley Mclaine pelo braço. Chutei a porta. Montamos. Nevasca miserável queimava meu rosto. A senhora Shirley Mclaine apertava seu corpo contra o meu. Segurava firme minha cintura. Apertava. O meu cavalo não tem ferraduras. Ainda selvagem. Será uma longa jornada longa. Não matei o juiz Tonny Law nem o reverendo Still. Atirei nas pernas. As nuvens vermelhas caem sobre meus olhos. Estou triste. A senhora Shirley Mclaine não tem nada a ver com esta minha tristeza de gambá bêbado. Joguei longe a garrafa de Whisky de comanche do miserável mexicano Será uma longa jornada longa. A senhora Shirley Mclaine parece que dorme. O seu rosto é quente. Esquenta o meu coração. Diacho!

O jardineiro e o pescador
Quando se encontram
Trocam só duas
Palavras:

Flor,
Peixe.

E caminham seguros
De que o jardim e o mar
São preciosidades de cada um.

Colhi muitas lágrimas na minha vida.
Guardei-as em alforjes, ânforas, xícaras.
Hoje, nesta manhã, levarei minhas lágrimas
Dentro do meu peito, entre as minhas costelas.

Sei que posso fazer fogo
E aquecer o tempo frio
Lá fora.

Então, sigo.
Trêmulos cílios,
Mas sigo, baby.

Sigo.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

Meu filho, escrevi cartas:
Segurava firme a caneta
(Embora a mão trêmula)

E as palavras escorriam
Tal como água de chuva
Pelas calçadas de pedra.

O milagre era o envelope
Sonho que se recebia
De volta à espera
De louco quase
Demente.

Cheirava o envelope,
Meu filho, cheirava
Qual um viciado
Antes de abrir
A alma.

Eau de L'arc o perfume
Do meu primeiro amor.
(Minha primeira morte)

O sagrado da poesia
São os dados jogados.

Não há fortuna
Senão os dados.

Jogados.

A grande dor no coração de seu Sebastião
(Um pescador das antigas da minha aldeia)

Não foi perder a mãe aos cinco
Nem o pai sob tempestade
Em alto mar aos quinze.

Mas perder o seu amor "a sua nega"
Pra um capitão de um cargueiro de Chipre.

Seu Sebastião não morreu de alcoolismo.
Nem se escondeu recluso em uma cabana.

Seu sebastião foi escrever cordel
E viver das suas rimas que sempre
Acabavam com dor, tristeza e pinga.

Corre uma lenda
Que seu Sebastião
Era Camões encarnado.