sexta-feira, 29 de maio de 2015

Deixa tocar,
Baby.

Impossível atender
Ao telefone com
As duas mãos
Ocupadas.

Uma escrevendo poemas
E a outra debaixo da mesa

Levando-te
À luxúria.
Não confio em teu coração.
Mas amo as aréolas dos teus seios.

Sobretudo
No tempo frio.
Acabei de apagar um poema
E consegui ouvir do último verso:
"Vida que segue, poeta, vida que segue."

Agora dei pra ouvir
Os últimos versos
Sumindo do mapa.
Você morre
E todo aquele
Amor dos outros
Some em três dias.

Você morre
E há quem
Sorria.

Levantei-me da cama
Com um pressentimento
De que viverei até cair todos
Os meus dentes de aço e leite.

Não me peça pra abrir a boca.
A minha arcada dentária tá dormente.

Aliterações perseguem-me
Até de madrugada, baby.

Ainda bem que a poesia
Perdoa aqueles distraídos
Que só depois de cadavéricos
Sentem falta de uma alma aérea.

Não tenho visto mais formigas.
Gostaria que você soubesse.

Creio que agora
Pertenço ao vazio
Da casa dos meus avós.
Já joguei búzios
Por minha intenção.

Os poemas que escrevo
Penso em alguém.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

Um golfinho em alto mar
Seduzido pela lua cheia
Não se esforça tanto pra
Conquistar a sua parceira.

Basta o olhar
De quem vai
Morrer,

Caso o seu amor
Não tire o vestido.
Nunca vasculhei tua bolsa.
Mas não duvides que ao dormir
Invadia o teu coração sem piedade.

Qualquer mero pensamento
Em que eu não existisse
Era um tormento.

Daí o mau humor
Das noites sofridas.

E tu imaginavas
Que fosse falta
De grana.

Ou ausência
De inspiração.

A solidão é um presente dos deuses
Pra gente fazer origamis, bonsai
E casinhas de palitos.

Outros enlouquecem
A escrever versos.
Se um dia arranquei tuas unhas
A ideia foi plantar uma cerejeira
Com as cores dos teus esmaltes.

Cabível ao sonhador
O ciúme das flores.


quarta-feira, 27 de maio de 2015

Desapego não é fazer
Uma lista de mil coisas

E sob epifania
Doar a asilos
E parentes.

Desapego é esquecer-se de si
Durante o milésimo de segundo
No último suspiro de vida: coisa
Que só se sabe no fim da jornada.

E não haverá
Como mentir.
Você tem o direito
De me sacanear
Por dias.

Voltar da praia
Com o corpo
Todo marcado.

E ainda me pedir
Um café especial
Que só o poeta
Sabe fazer.

Claro que você
Tem esse direito.

Somos apenas
Amigos e tristonhos.
Não compro mais remédio pra minha cabeça.
Sou mesmo louco e canalha pelo resto da vida.

O que desejo agora é uma âncora
Pro meu coração, uma linda cobaia.
Casar e ser feliz
É possível um
Dia. Os outros
Dias são de
Sonhos.

Sob tempestade
O navio revela
Sua beleza.

Não há outra saída ao capitão,
A não ser jogar baralho
Com o cozinheiro.

Verdade, marujos:
Peixes não comem
Olhos de covardes.

No fundo do mar
Dura pouco tempo
O transe de outra vida.

terça-feira, 26 de maio de 2015

Leal espero que a poesia
Cumpra com o seu dever
E ofereça-me a cada dia
Uma morte e um poema.

Preciso levar ao túmulo
Meus ossos reluzentes.

Tive tanto dó das minhas botas
Esquecidas debaixo da estante.

Tristes.
Mofadas.

Outro dia te escrevo uma carta.
Ainda não perdi o tato com o papel.
Choveu há pouco
Quando nem as calçadas
Esperavam chuva tão doce.

Não fiz a tatuagem
Que havia lhe prometido.

Pensei em seus cachos
Dos cabelos e nos laços
Das suas peças íntimas.

E a minha mão
Esqueceu o poema
Para tocá-la de verdade.

Com o tempo,
Sátiro criou asas
E hoje é um passarinho.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Não emoldure aquele poema
Cuja alma você imagina especial
E não pregue na parede da sua sala.

Os poemas pródigos
Que esquecemos na rua
São mais sinceros e dignos.

Não lembramos bem
De como foram escritos
Se com sangue ou lágrimas.

Mas não saem
Do nosso crânio

Os versos de fogo.
Os versos de lama.
Passo pela varanda fugindo das plantinhas.
Algumas dormem sobre as cadeiras de vime.

Não seria bacana da minha parte acordá-las
Quando elas sonham com os seus pombos.

Há séculos que não pergunto
Como batem os seus corações.

Ando frio, perdido,
De cavanhaque.

Já pertenço a alguém
Que me aguarda
No fim da rua.

O seu rosto é névoa.
As suas vestes são brumas.

O seu andado é de lua
Sobre as ondas do mar.
Inventei esse negócio
De escrever poemas
Pro meu coração

Não parar
Em paz.

Tinha medo
De morrer
Dormindo.

Como morreu
O meu avô.

domingo, 24 de maio de 2015

Que validade tem o verso
Se não apertarmos o gatilho,
A forca e os nós dos sapatos.

A poesia brilha
Nas roupas sujas
Do andarilho incrédulo.

E o caminho não acaba
Quando o corpo tomba.
Amo o fim
De qualquer
Sentimento.

Muito mais
Que o princípio
Do que é sonhado.

Após o último passo
Não existem só
Pegadas.

Há um sol
Que nasce.

sábado, 23 de maio de 2015

Não perdoo
Nem a mim
Nem o outro.

Meu coração
Não se machuca.

Aperta-se sozinho
Como é comum
Aos efêmeros.

A quem perdoa
É fácil esperar
A vingança.

Angústia própria
Dos puros de caráter.

O que tenho a oferecer
São versos que servem
Para esquentar os ossos.

Perdão?
Não seja tolo.

Os pássaros
Só desejam
Um pouco
Da noite.

A vigília inicia
Ao amanhecer.
As cicatrizes das minhas mãos
Que amassam meus cílios
Mostram o meu engano.

Não durmo feliz
Por que escrevo.

Nem acordo profético
Imaginando entre as costelas
Aquele suntuoso vazio dos tristes.

O poeta que sou
É tão inútil quanto
Uma xícara de chá.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

E ao me beijar o rosto
Beije os meus olhos.

Minhas lágrimas
Têm um perfume
Especial de queda.

Nunca passarei
Pelas nuvens
Inteiro.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Se não te basta a dor
De plantar flores,

Bastará a fúria
Do fim do sonho.

Não repouses tua cabeça
Sobre o teu coração
E a mentira.

Aos que veem o céu azul
Há merecimento na solidão.
Ofereceram-me uma tocha
Para iluminar o caminho
E queimei o coração.

A minha natureza é a fuga
E a morte nunca chega
Quando chamamos.

terça-feira, 19 de maio de 2015

Sonho com um poema
(Até canto acompanhado
Por um sax sensual e tímido)
Acordo e o que me sobra são
Dois versos de imaginação tola.

Antigamente acordava
Com uma carta no bolso.

E o peito riscado
Por tuas unhas.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Com que responsabilidade escrevo versos.
À espera que alguém me pague um drinque.
E me convide à sua casa e aos seus medos.
Quando eu morrer
Não quero ir pro céu
Onde ouvi dizer que lá
Só vivem os justos e corretos.

Nem penso em pagar passagem pro inferno
Onde os cínicos festejam o vazio e a derrota.

Rogo distância do meu coração o caminho do medo
Onde dormem os hesitantes trôpegos e mais covardes.

Quando morrer só desejo
Ser alimento da terra
E oxalá de alguns
Passarinhos

De bicos curvos,
Asas reluzentes,
Olhos miúdos
E alegres.

quarta-feira, 13 de maio de 2015

Outro dia falaremos
Sobre nossa ausência.

As asas pertencem
Aos passarinhos.

Bebeu o seu café?
Escreveu poemas?

Não se apegue ao que você não ouve
Do seu travesseiro as batidas do coração.

As lágrimas esquentam-lhe o peito
E procuram portas em casas distantes.

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Cometo galicismos com tanta doçura
Que reconheço o poeta cafona que sou.

Assim, meu amor,
Nós dois juntinhos
Descobriremos segredos
Dos trovadores das montanhas.
Deixe as suas lágrimas,
Por um instante, dentro

Dos seus olhos, sinta
O fogo e não acredite
Que as suas costelas

Sustentarão
Para sempre
O seu coração.

quarta-feira, 29 de abril de 2015

O espirro de uma mulher
É igualzinho ao espirro
De uma abelha

Ao abanar asas
E jogar pólen
Em uma flor.

O da minha vizinha
Sem dúvida que é.

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Se as batatas que você plantou
Ainda não deram ar da graça
Não culpe os céus,

A falta de chuva
Ou tempestade.

Se as batatas que você plantou
Ainda não criaram raízes,

Olhe pras suas unhas
E veja se brilham
Sujas de terra.
Amanheci o dia sem forças
Nem pra abrir o pote de açúcar.

Mas quero casar. E ter um cãozinho.
As formigas (enfim) fora de questão.

Chega de vida fácil.
Há poemas que não nos deixam levantar da cama
Com mãos de ferro nos seguram os pés como
Adventistas dos últimos dias e a gente

Acaba se acostumando a escrever
Sem lápis e sem papel a repetir
Mil vezes o mesmo grito

E a ouvir o eco
Da nossa voz
Até a morte.

quarta-feira, 22 de abril de 2015

Não ensinei ao meu filho andar de bicicleta.
Mas o seduzi a que escrevesse um poema.
Coisa que o rapazinho fez aos nove.

Paguei-lhe as cinco moedas prometidas.
E o amiguinho da onça nunca mais poetou.

Enquanto a poesia
Não doa a metade
Do seu olho, vivo
Capenga e cego.
Fizeram-me tanto susto
Quando eu era pequeno.
Deixaram-me tantas vezes
Pra trás em corredor escuro.
Que cresci amigo de fantasmas.


Ensinem a esses homens
Que só conhecem o calor
De uma arma,

Ensinem a passar uma tarde
Jogado no sofá namorando.

(Descobrindo
Sinais secretos
Da tesuda amada)

Ensinem a esses homens
Que só conhecem uivos
E gritos de guerra,

Ensinem a sussurrar malandragens
Aos ouvidos de quem se ama.

Vamos lá, andorinhas,
Visitem o coração
Desses loucos.

Eu já morri.

terça-feira, 21 de abril de 2015

Se eu tivesse um animal de estimação
seria uma gatinha como companhia
e ela amaria brincar com o novelo
dos meus cílios e arranharia
meu rosto com delícia.

Mas só tenho formigas
e todas muito sérias.


Cabides
Tremem
No varal.

Os cabides são magros
Por tremerem no varal
Ou tremem no varal
Os cabides por
Ser magros?
A primeira vez que meu coração parou de bater
Vi uma menina com o seu bambolê na calçada.

Usava meias polainas.
(Dançava jazz a menina)


Curioso, há passarinhos
Que miam na copa das árvores
E penso que é um gato em apuros.

As oitis da minha calçada
Com seus longos galhos
Riem da minha cabeça.

E sussurram ao meu ouvido:
"Passarinhos apaixonados,
Poeta, cantam como se
Ronronassem..."
Pra conversar com crianças
Não precisamos mudar a voz.

Um adulto com voz de neném
Não faz com que a criança
Confie mais ou menos.

"Não mude a voz, garota."
Quase aconselhei a mulher
Que se aproximou da sobrinha.

Mas não ia fechar o livro.
A leitura estava ótima.
A pracinha tranquila.

Deixei a mulher
Com a voz de neném
Conversando com a sua sobrinha
Que pelo que consegui ouvir era aniversariante.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Sempre que o caminhão de lixo
Passa em frente à minha casa
Fecho as janelas e sinto dó.

Como se todas as noites
Eu apunhalasse o motorista
E os seus rapazes da coleta.

Um dia, convido
Para que subam
E bebam café.
Só vou tomar o meu remédio na hora de dormir.
Ontem, tomei muito cedo, acordei em seguida
E fiquei pela casa qual uma barata tonta sem
A mínima noção. Até um couro de bode fui
Tingir na varanda em companhia
Dos meus antepassados.

Há tempos, meu filho,
Que entreguei minha vida
Nas mãos da poesia. Ela que
Dita meus passos, voos e rosto
Amassado no chão. Por isso, sem essa
De contrição barata ou ódio eterno. A poesia
É uma seta de pelicanos cruzando o céu ao amanhecer.

Também uma meia
Largada sobre o pufe.