terça-feira, 20 de outubro de 2015

Acidente

Não vi a morte de perto. Mas, ontem, rodopiou na minha frente um fiat depois de haver batido na frente do meu ônibus. Sempre pego Papicu-Parangaba quando retorno do meu trabalho. Uma senhora que estava ao meu lado, na cadeira alta, próxima ao motorista, entrou em pânico. Abraçou-me. Pediu-me o telefone. Confessou-me, ainda tresloucada, tremendo muito, que foi Deus que me enviou como anjo. Perguntei por que anjo e o que fiz. A senhora, elegante, apesar de louca, jurou-me que se eu não estivesse ao lado dela provavelmente nunca teria tido coragem pra olhar os meus olhos e perceber que sou um filho-da-mãe solitário e cheio de tristeza no coração e na alma. Eu gargalhei. E fugi. Muitos passageiros ainda ficaram na calçada esperando outro ônibus. Eu fui caminhando até em casa. Uns bons e longos quarteirões. Não tenho barriga. Mas fico muito tempo sentado diante do computador na sala de Epidemiologia e almoço besteira. Já pensei em levar marmita. Não tenho quem a prepare e entregue nas minhas mãos com aquele ar de ternura de uma nutricionista apaixonada. Não vi a morte de perto. Só uma senhora carente que lia um livro e quase se lançou contra o para-brisa. Em outra situação, convidava-a pra beber um café. Se a dama quisesse uma bebida, teria de pagar o meu drink e ouvir toda a minha loucura.

Nenhum comentário:

Postar um comentário