quinta-feira, 2 de julho de 2020

Das Levezas

Já escrevi poema
sobre o apito
da chaleira.

Sobre a timidez
e o medo de Lola.

Sobre meu espírito
e as minhas bolas.

Sobre o meu bigode
e a metafísica dos objetos.

Já escrevi poema
sobre as cicatrizes
do meu pulso esquerdo.

Sobre os passarinhos
das árvores de oiti.

Sobre a camaradagem
do meu bermudão surrado.

Já escrevi poema
sobre o meu primeiro amor 
e sobre a magia negra do cinismo.

Já perdi alguns dentes.
Já perdi meus óculos.

Já escrevi poema
sobre as romãs
da clínica 

e sobre a psicóloga
os cílios postiços
e seus sapatos.

Já escrevi poema
sobre a morte
do louco.

Sobre a chuva,
sol e festins.

Já escrevi poema
sobre fantasmas
da infância.

A dor, a doçura
e a fatalidade.

O apito da chaleira
é só uma súplica

da água 
fervendo.

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