terça-feira, 31 de maio de 2016

Um suspiro teu
São todos os
Meus ais,

Desde o dia
Em que me deitei
No quintal dos meus avós

E as nuvens
Dançando ciranda
E soltando as mãos

Entraram
Em meus
Olhos.
O mundo,
A aldeia,
A corte,

Sacam nossos corpos queimando
Dentro dos nossos olhos de criança.

Tiro as luvas,
Você tira as luvas,

Descemos a escadaria,
Passeamos pelo jardim:
"Edward Mãos de Tesoura
Quem esculpiu esse jardim?"

Sorrio acanhado,
Você me puxa
Pela nuca.

A suposta fragilidade do poeta,
A sua maior força: toca flauta
Com um riso na ponta
Dos lábios

E a serpente
Dança.

Não te falei
Que tenho
Visão de
Raio X?

As meninas
Que apresentam
A previsão do tempo na tv
Conhecem a minha sensibilidade.

De tanta paixão,
Chego a tocar-lhes
As saias, vestidos, tailleur.
Quando vejo as tranças
Queimadas de sol e sal
De um rasta, lembro-me

Dos camarões
Da minha serra.

Naquele tempo,
Não era bruxo
(Nem sou
Agora)

Mas adorava
Contemplar
De perto

O céu,
As fontes,
As grutas.

Seguia borboletas
Pelas trilhas e nunca
Esquecia o caminho de volta.

Chove, meu bem:
Cadê os seus cabelos
Pra me esquentar o rosto?

Não conheço, menina,
Outra forma tão doce
De enxugar lágrimas
Quanto seus cachos.

Há manhãs em que o poeta
Acorda tão bondoso que
Perdoa e poupa
A vida

Das baratas
Que passaram
A noite toda sobre a mesa
Confabulando a favor da câmara dos lordes.

Complacência que dura exatamente
(Olhando o relógio de parede)
Um minuto.

Cedo ou tarde,
Voltarei a aguar

As plantinhas
Da varanda.

Só preciso de um tempo
Pra me acostumar com
A ideia de que
Não morri.

Existia uma verdade
[A única verdade que existe]
Durante as minhas mentiras.

Um anjo que segurava
Os meus braços

E pulávamos
Do precipício.

A morte pode ser
A porta do entendimento
Ou um eterno jogo de dados

De sete
Faces.

segunda-feira, 30 de maio de 2016

O meu coração
Faz o que quer
Com as palavras.

E a poesia
O que quer
Com o coração.

E o poeta
Escapa de fininho
Pra beber o seu café.


O meu coração
Faz o quer com
Com as palavras.

E a poesia
O que quer
Com o coração.

E o poeta
Escapa de fininho
Pra beber o seu café.

Vergonha
De me aproximar
De você e oferecer-lhe
Uma flor da minha pracinha
Mais um poema. Certamente,
Chorarei perto dos seus cabelos
A sentir o seu perfume, veja, ponha
A sua mão sobre o meu peito e ouça
O coração do meu amigo de infância:

Quixote
De bermudão.

Só precisava de uma mão amiga pra escrever meus poemas.
Sabe, guardei uma camisa especia pro dia que te conhecer.
Desbotada, que acabei de tingir.

As manchas lembram minha juventude,
A parte boa, menos as espinhas
E a languidez de dormir
Séculos na escola.

Muito rápido
A minha paixão
Pela professora de inglês:

Enroscava a língua
Entre os dentes
A molhar

Os lábios
De batom
De cereja.

Jamais passei um ano novo sozinho.
Sempre matei um fantasma e ressuscitei
Um morto e, nessa manobra sem fim de matar
Fantasmas e ressuscitar mortos, definho-me a ponto
De um sabiá assombrar-se das minhas clavículas (tapando
O bico com as asinhas) compadecido da minha figura de poeta.

O meu primeiro amor
Tinha um nariz que
Parecia uma
Batatinha.

Charme
Ou trabalho feito
Que me fez enlouquecer
Ao separar-me da pequena:

Rapei a cabeça, cortei o pulso,
Pintei na parede do quarto
A sombra de Hades.

A poesia não me desaponta.
Nunca. Não se apega
Às coisas desse
Mundo,

Embora mais carne
Que espírito.

O encantamento dos dedos
Apenas pra luzir os anéis.

E convidar os ladrões
À outra palma da mão.
Em ponto de bala
Basta que você encoste
O seu joelho no meu joelho

O meu coração dispara e lhe
Mostro um lírio dentro do bolso.

Beije-o
Com amor.

Não entendo
Como a poesia
Poderia perder a força

Ao ser revelado
Mau caráter
O poeta.

Desde muito cedo,
Emociono-me bebendo
O café da minha vó xamã.

Depois, espano
O meu estojo

De dardos
Envenenados

E vou
Pra selva caçar
Macaquinhos e capivaras.
A poesia nunca perderá o seu amante.
Só uma questão de tempo, Sincronicidade
Junguiana, providência divina. E um dia, pá!

Você dá de alma
Com o poema

Mais lindo
E espantoso
Da sua vida.
Adivinhe o presente
Que ganhei cedinho
Ao abrir a janela
Da varanda:

Um coro de passarinhos,
Inclusive os pombos,

"O poeta voltou,
Ô, ô, ô, o poeta
Voltou..."

Imagine as minhas lágrimas,
O tremor dos meus lábios,
A minha xícara branca
De café aos prantos.
Miserável o homem
Que não se emociona
Dos encantos da mulher.

As lágrimas
(A queimar os cílios)
Que são riso de criança.

A alegria frenética
Que é uma melancolia
Tão profunda, tão profunda.

Ao dizer que dói a cabeça,
O corpo todo até os pés,
Entrega-se à paixão.

E sonha
Com um filho.
Se o poeta sofre um infarto fulminante,
Os passarinhos já lhe roubaram
O coração.

E não tem papo.
Não há volta.

Sabe-se lá
O que os passarinhos
Planejam com nosso amor.

Sonhei com uma sinfonia de garrafas
Debaixo da sua janela soprando
As boquinhas.

Garrafas
De suco
De uva.

Se fosse de vinho,
Teria virado a noite
E ainda estaria louco.

domingo, 29 de maio de 2016

Assim que os meus cabelos cresçam
E eu dê um jeito nos meus dentes
Jantarei com os seus pais.

Entendo a preocupação
Da família real diante
Do louco e herege

Mamando
O tesouro
Da filha.

Juro que parei
De dar golpes
Depois que te
Conheci, milady.

Uma dúvida,
Aquele colar
Que sua mãe
Desfila

Diamante
Rosa?

Desisti de aprender a dirigir
Quando sofremos aquele
Acidente subindo à
Serra

Em que
Atropelamos
Um cavalo.

O poeta não estava ao volante,
Mas o cavalo ficou segurando
Firme a direção

Ao atravessar
O para-brisa.

Quando estudava matrizes
As colunas imaginárias
Enlouqueciam-me.

Supunha déficit de atenção,
Mas era só agitação poética.

Resolvi então preencher
Os espaços vazios
Com palavras.

E fez-se luz
Augusto de Campos!

Ao descobrir
Que meu encantamento
Não finda (nem minha lábia)
Você cairá em um triste cansaço.

Não tenho responsabilidade
Por meus sonhos, meu bem.

E isso é difícil
De conviver
Ou aceitar.

Não quero pensar
Que é felicidade
Esse estágio
Final.

Não matarei meu cavalo
Alongando o caminho.

Já cavalgamos
Por muito tempo.

Minhas pistolas remington
Estão geladas e as balas
Não fazem barulho
Na noite.

Não me lembro de muita coisa quando nasci:
Se havia um anjo torto à cabeceira
Ou Nossa Senhora rezando
O terço.

Só ouço o fórceps jogado à bandeja de aço
E a premonição do  médico: "Esse
Dará desgosto..."

Danço lavando
A louça do almoço
Ao som do rádio ligado
Na área de serviço: um dia,

Ensino-lhe os passos
De um mamulengo
Embevecido.

Imagine um espantalho de varetas
E papel de seda ao vento
No meio de um campo
De girassol.

As palmas das minhas mãos envelhecidas
Com desenhos de velas de navios fantasmas

Tateiam o caminho
Da mesa, da xícara.

Acima do vento
Os dedos quase
Batucam o silêncio.

Cheguei a um nível de amor
Com as formiguinhas que
Consigo deixar

O pote
De açúcar
Destampado

E as meninas
Ficam estátuas.

As que se atrevem
Amo mais.

A serpente
Que cospe
Engole

Em maior
Proporção
O veneno.

Daí, aquele
Olhar malsofrido
A imaginar que o mundo

Anseia
Matá-la.

Sabonete de namorada
Que arde nos olhos
Derrama lágrimas
De saudade.

Normal os rostos que eu vejo
Nas paredes descascadas,
Nos troncos das árvores,
No fundo da minha
Xícara de café.

Revê-los
Que perde
A graça.

Quase morri do coração
Quando vi o meu rosto
Tatuado em sua
Coxa.

Contemplar as árvores da calçada é um enlevo.
Uma voluptuosa ciclista que cruza meus olhos
É bem mais interessante. Uma delícia
De encantamento.

As oitis
Que me
Perdoem.

.

Você tem certeza
Que vai querer
Esfaquear
O peito

Por nuvens sujas
No solado dos tênis brancos
Que você imagina, meu caro?

Você não sabe
Do céu novo
Que arde.

Guarde sua ira,
Procure pela casa
O chiclete antigo do
Seu primeiro amor, rapaz.

Abençoe
O seu dia.

Bom dia, Pateta.

Dia, Mickey.
Como passou
A noite?

Acordado.
Rolando
Na cama.
Sonhando
Com Minnie.
Apaixonadão.

É, Mickey, desde
Os anos vinte.

A propósito, Pateta
Noite passada fui
Ao quarto da Minnie.
Sabe, cara, presenteei-lhe
Uma peça deslumbrante
Da Victorias's Secret.
Conhece esses sapatos enormes?

Parecem meus, Mickey.
São meus, sim, meus.
Onde os encontrou?

Debaixo da cama
Da Minnie, brother.

Opss. Foi mal, cara.

Tranquilo, Pateta. Minnie explicou.
Tu precisavas trocar os cadarços.
Sei que é uma confusão
Pro você.

sábado, 28 de maio de 2016

Os braços raquíticos,
As costelas aparecendo,
O olhar louco de indiano.

Iluminação
É isso.

Só falta criar um cachorrinho
No apartamento de mamãe.

De uns dias pra cá
Sorrio sozinho
E choro -

Uma
Graça.

Não posso ver uma menina
Segurando o seu cãozinho

Que pergunto
Se é aquele
Voyeur

Da propaganda
Espionando
A vizinha

Com uma
Xícara à boca.

Aliás,
Ótima
Cantada.


Por favor, meu bem,
Quando escrever
Poemas

Em seus cílios
Não passe rímel.

Chorar
Pode.

Como tu gostas de passear pela casa após o banho.
Ora soltando a toalha a sorrir fingindo-se assustada,
Ora séria jogando o guarda-roupa sobre a cama.

Minto se não amo
As tuas manhas.

Dostoiévski entre
Os meus dedos
Suspira.

Meu bem,
Ciúme da minha
Xícara branca de café?

Da delicadeza
Em que seguro
A asinha, bem?

Do biquinho
Que faço?

Não se esqueça, meu doce,
Que foram minhas xícaras
De café quem me ensinou
A beijar: se agora os seus
Lábios estão dormentes,
Viçosos, corados,
Viva!

Agradeçamos
A elas, amor.

Os passarinhos
Amam as lagartinhas,

Mas não dispensam
Uma tenra carne.

Alguns choram
Sobre o prato.

E bicam delicados
Entre a cabeça
E o abdome.

Nem me olhem,
Criaturinhas.

Não vi nada,
Não sei de nada,
Não escutei nada.

Um sapoti sobre
O parapeito da janela
Da área de serviço: Ah, que
Passarinho gentil trouxe-me
Esse presente. Nem tocarei.

Acenderei uma vela
E oferecerei tal dádiva
Às divindades da doçura.

Mais tarde tratamento de pele.
As niñas do salão da lojinha
Logo estarão à cabeceira
Da minha cama.

Espero que venham à vontade:
De sainha, camiseta sem sutiã,
Felizes e com creme de maçã.

Maçã, serpente, pecado:
Que abençoado dia,
Ó meu deus!
Quase peguei
Em pleno voo
O sabonete,

Coisa que fazia
Normalmente
Aos nove
Anos.

Só que aos cinquenta
Os joelhos não são
Mais de gafanhoto.
Quem anda me regulando
São as formiguinhas
Do açucareiro

Sob ordem e regência mediúnica
Da anciã, a xamã, que se veste
De túnica laranja e colares
Do planalto Asteca.

Batem na minha mão,
Na terceira colherinha cheia.

Lembram-me que tenho
Histórico familiar de diabetes.

Ora, também tenho
Histórico familiar
Messiânico.

Nem por isso
Ando sobre
Águas.

Mal acordar, ainda bambo,
Entrar na cozinha e uma
Banda de abacate
Sorrir-lhe:

Ah, que
Milagre.

Agora, só o açúcar
E a farinha. Amor,
Depois você
Espreme

Das minhas costas
Algumas espinhas?

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Ó minha flor, é que o miserável
Quando ganha no jogo de dados
Pensa que o mundo é o teu jardim.

E danço cego
De tantas estrelas.

Claro que emagreci,
Minha querida.

Mas já devolvi
O cachimbo
De minha
Vó.

Agora são os passarinhos
Que seguram os meus ombros.
Ou o vento da tarde leva junto
O meu coração e minhas costelas.

Voe e pegue
Minha mão:

Os dedos trêmulos
Loucos pra escrever
Sonham com seu sorriso.

Antes que as gaivotas
Mergulhem e pesquem
No bico todas as sardinhas

Consideremos
Aquele golfinho
Um tanto tímido

Espreitando de longe
A ganância das aves.

A sua solidão
É tão faminta.
Mas delicada.
A energia da meditação transcendental
De tal ordem comovente e louca
Que lavo a cuscuzeira
Com os olhos.

Lindas as bolinhas
De detergente
Que suspiro
E assopro.


Penetro em você
Com a polpa
Da palavra

E forma-se fila
Uma a uma
Palavras

Ligando
Versos.

Você suspira ardente
Grávida da palavra
Que é nervo, suor,
Corpo.

(foi bom
pra você,
meu doce?)



As plantinhas da varanda
Cresceram e multiplicaram-se
Sob a minha loucura e desleixo.

Felizes os pombos
Em doce e eterno
Idílio

Com as pequenas,
Exuberantes,
Viçosas.

Até enxergo
Casamento.

O meu sorriso gostoso
É só para os íntimos:
A minha xícara
Branca de
Café

E a formiguinha anciã
A xamã do açucareiro.

Nunca te contei, meu amor,
Mas já limpei dos meus dentes
Fiapos de manga e de carne com
O teu cabelo longo, doirado e macio
Enquanto tu dormias de conchinha. Feliz.

quinta-feira, 26 de maio de 2016

O que sugere redundância em um poema
É só um suspiro a mais que o poeta
Não consegue segurar.

Perdoemos a aurora
Que atravessa
O mar.


Já pensou em tatuar
As batatas das suas
Pernas?

Um navio,
Um girassol.

Sei lá, alguma coisa
Que eu possa morder
E sonhar feito criança.




Teu ventre
Tão perto
Do fogo

Enquanto
Preparavas
Meu banquete:

A lembrança
Que tenho
Do teu
Peixe

Com
Cogumelos.

O que o poeta
Quis dizer ou disse
Não tem importância.

A chave do reino
Vem em silêncio.

Parece até
Confusão.
O milagre é uma força suave
Que desmorona a altivez
E dobra em veludo
Sobre o coração
A doçura,

Ainda que a espada
Corte em fatias
Os cílios.

Guardar uma formiga
Dentro de um pote
De açúcar

Pra vê-la feliz
É um equívoco.

Há formigas
Que somente sonham
Com os sussurros da cafeteira.



Lanço a isca
Da melancolia

Pra ver se você
Sente dó da minha pena
E vem pra casa de cachinhos.


A arte dói na carne
E a poesia não poupa
As mãos do criminoso.

Por influência dos túmulos
Que meu pai ergueu
Meu fim será
Breve.

Nem ai.
Nem ui.

Só olhos
Cansados.

Chorosos
De passarinho.
Há um preço alto
Por essas asas
Que crescem
Pra dentro

Quebrando costelas
Rasgando carne
Bebendo
Sangue.

Quando ouvia
Ana Cañas
Sonhava.

Você perdeu
A minha inocência
De sorvetes e licores.

Você jamais imaginaria
Que o inferno estivesse
Tão perto da porta da
Sua casa.

E que surpresa
O caminho da luz
Ao lado da miséria.


quarta-feira, 25 de maio de 2016

Há tempos
Não fazia
Pipoca.

Então era isso
Que o meu coração
Queria: fazer pipoca,
Salvar minha alma e acordar
Os bebês e os poodles do prédio.

Em manhãs como esta,
Acordo com o braço
Sobre a boca
Do fogão

E esqueço
O cigarro
Na ponta
Do lábio.

Forte,
Sadio
E feliz:

Canta meu anjo da guarda
Horrorizado das queimaduras
Em forma de desenhos infantis.

terça-feira, 24 de maio de 2016

Jurei por minha alma
Que não foi o poeta
Quem roubou
O relógio
Cartier.

Minha mãe e minha irmã
Não acreditam, mas eu vi
Um bando de formiguinhas

Levando a peça
Como se em procissão
Conduzissem um totem
Ao buraco da parede.

Minhas cúmplices
Precisam saber
A hora exata
Da minha
Morte.

Um festão,
Baby.


Há cadáveres que dormem a vida eterna.
Outros despertam ao distante ruído
De ratos dentro do fogão.

O primeiro comprimido do dia
Lembra-me as calçadas da infância.

O saudoso raio de sol
Descama meus cílios.

Nunca viste um cadáver
Que chora, meu bem?

sexta-feira, 20 de maio de 2016

As musas enlouqueceram-me.
Nem sequer toquei em um fio
Dos seus cachos.

Enlouqueceram-me
Por belas e ricas.

E eu um velhaco
Devedor de cervejas
Em esquinas perigosas.

Um dia,
Retornarei à cena do crime
Com a velha lâmina enferrujada.

Será o pulso direito
A ser talhado da cor de sangue
Dos arrebóis dos trovadores malditos.