Quanto equívoco
Quando dizem
Que escrever
Poesia
Não é viver,
Meu deus.
Se soubessem
Do oxigênio volátil,
Das contrações, dos
Cabelos brancos, das
Ranhuras das unhas, dos
Calos nos dedos, das peles
E escamas deixadas pelo caminho.
Se soubessem
Da imensa vida
Trocada em silêncio.
Se soubessem da febre,
Inclusive da quase morte.
Se soubessem
Dos pedaços
De flores
E cristais de açúcar
Sobre os ombros
Das formigas.
Se soubessem.
sexta-feira, 21 de agosto de 2015
Hoje é dia de jejum.
Já abri a janela
Da varanda
E separei uma
Almofadinha
Pra cada
Um.
Quero vê-los
(Meus passarinhos)
De pernas cruzadas.
Meditando, jejuando,
Orando, refletindo
Sobre suas vidas
De céus.
Alguns andam
Bicando lagartinhas
Com requinte de crueldade.
Olham-me meio sonsos
A esperar um sorriso
De volta.
Já abri a janela
Da varanda
E separei uma
Almofadinha
Pra cada
Um.
Quero vê-los
(Meus passarinhos)
De pernas cruzadas.
Meditando, jejuando,
Orando, refletindo
Sobre suas vidas
De céus.
Alguns andam
Bicando lagartinhas
Com requinte de crueldade.
Olham-me meio sonsos
A esperar um sorriso
De volta.
A primeira coisa que faço
Ao acordar não é abrir os olhos.
Não abro os olhos.
Custa-me a vida
Tirar os seus cabelos
Do meu rosto, então vivo
De olhos fechados esperando
Que você acorde me dê bom dia
E levante-se louca pela casa descalça.
E eu amo os seus pés.
Adoro sujar as minhas bochechas
Dos seus pés empoeirados da manhã.
Ao acordar não é abrir os olhos.
Não abro os olhos.
Custa-me a vida
Tirar os seus cabelos
Do meu rosto, então vivo
De olhos fechados esperando
Que você acorde me dê bom dia
E levante-se louca pela casa descalça.
E eu amo os seus pés.
Adoro sujar as minhas bochechas
Dos seus pés empoeirados da manhã.
quinta-feira, 20 de agosto de 2015
Pegue a sua Bíblia
E os livros de culinária
Da sua falecida senhora
Há trezentos anos e guarde
Dentro da sua mala juntamente
Com suas gravatas de linho e lenços.
Despache pra Sibéria
O seu coração antigo.
Compre na C&A
Bermudões de surfista
E adquira um novo status
De gente boa, feliz e solícita.
Descubra um jeito
De assaltar o banco
(Da sua agência) e não
Roube as pensões dos seus.
Mas raspe até a última moeda
Dos empréstimos favorecidos
Aos empresários bonitões.
Não trema na hora.
Segure firme o revólver.
Não me decepcione, vovô.
E os livros de culinária
Da sua falecida senhora
Há trezentos anos e guarde
Dentro da sua mala juntamente
Com suas gravatas de linho e lenços.
Despache pra Sibéria
O seu coração antigo.
Compre na C&A
Bermudões de surfista
E adquira um novo status
De gente boa, feliz e solícita.
Descubra um jeito
De assaltar o banco
(Da sua agência) e não
Roube as pensões dos seus.
Mas raspe até a última moeda
Dos empréstimos favorecidos
Aos empresários bonitões.
Não trema na hora.
Segure firme o revólver.
Não me decepcione, vovô.
Se ninguém levá-lo mais a sério
E a solidão armar aquela rede
Cruzando as duas salas
Faça pelo menos exercícios
Pra ser um velhinho triste
Mas saudável.
Você precisará ir à cozinha
Pra pegar o seu café
Mais vezes que
Imagina.
E o banheiro dos fundos
(Quarto de empregada)
Será o seu glorioso
Inferno.
E a solidão armar aquela rede
Cruzando as duas salas
Faça pelo menos exercícios
Pra ser um velhinho triste
Mas saudável.
Você precisará ir à cozinha
Pra pegar o seu café
Mais vezes que
Imagina.
E o banheiro dos fundos
(Quarto de empregada)
Será o seu glorioso
Inferno.
quarta-feira, 19 de agosto de 2015
A minha vó dizia que amor
Só temos um e se perdermos
A vida será apenas de lamúrias.
A minha vó assoprava a brasa
Do fogão a lenha, enquanto
Seu neto palitava o dente
Aberto (um girassol).
Perdi o meu aos dezenove quase vinte.
Desde então (como dizia minha vó
Naquele tempo de fogão a lenha
E dente furado) a minha vida
São lamúrias.
Lamúrias.
Só temos um e se perdermos
A vida será apenas de lamúrias.
A minha vó assoprava a brasa
Do fogão a lenha, enquanto
Seu neto palitava o dente
Aberto (um girassol).
Perdi o meu aos dezenove quase vinte.
Desde então (como dizia minha vó
Naquele tempo de fogão a lenha
E dente furado) a minha vida
São lamúrias.
Lamúrias.
As luvas de muay thai do meu filho
Vivem jogadas sobre o cesto
De roupas sujas no quarto
Dos fundos.
Nunca treinei sério com meu filho.
Nunca trocamos socos respeitosos
Entre olhares focados e um riso feliz.
O meu filho também nunca escreveu um poema,
Exceto uma vez na infância quando tinha nove anos.
Não estamos quites.
Devo ao meu filho um round
De cinco minutos no tapete da sala.
Vivem jogadas sobre o cesto
De roupas sujas no quarto
Dos fundos.
Nunca treinei sério com meu filho.
Nunca trocamos socos respeitosos
Entre olhares focados e um riso feliz.
O meu filho também nunca escreveu um poema,
Exceto uma vez na infância quando tinha nove anos.
Não estamos quites.
Devo ao meu filho um round
De cinco minutos no tapete da sala.
A gaivota e o albatroz
São inimigos íntimos
De longa data.
Desde a criação
Do universo,
Considerando
Que a arca
De Noé
É fábula,
Meu filho.
No princípio,
O criador ofereceu
Ao albatroz uma envergadura
De asas fenomenal, enquanto
À gaivota um bico especial pra
Pescar sardinhas em pleno voo.
A gaivota sentiu-se traída,
Uma vez que pra ela
O albatroz também
Tinha um bico
Privilegiado.
Nunca se entenderam.
O albatroz gargalha
E a gaivota sonha
Em enfiar-lhe
Um arpão
No peito.
Deus não liga.
Deus não se importa
Nem com os seus filhotes
Que são sua imagem e semelhança
Por que haveria de ter dor de cabeça
Com duas aves narcisísticas e solitárias?
São inimigos íntimos
De longa data.
Desde a criação
Do universo,
Considerando
Que a arca
De Noé
É fábula,
Meu filho.
No princípio,
O criador ofereceu
Ao albatroz uma envergadura
De asas fenomenal, enquanto
À gaivota um bico especial pra
Pescar sardinhas em pleno voo.
A gaivota sentiu-se traída,
Uma vez que pra ela
O albatroz também
Tinha um bico
Privilegiado.
Nunca se entenderam.
O albatroz gargalha
E a gaivota sonha
Em enfiar-lhe
Um arpão
No peito.
Deus não liga.
Deus não se importa
Nem com os seus filhotes
Que são sua imagem e semelhança
Por que haveria de ter dor de cabeça
Com duas aves narcisísticas e solitárias?
Ainda bem que a vida tem sua mediocridade e brilhantismo.
Assim também a jornada poética de um jovem senhor.
Imagino se o poeta escrevesse
Somente épicos arrebatadores.
O que seria da nossa futilidade,
Apatia, mesmice e insignificância?
O equilíbrio de uma lesma
E de um passarinho
É a indiferença
Entre
Ambos.
Não sabem que morrerão.
Mas o poeta palpa a nuca.
Sente a semente
De mostarda.
Assim também a jornada poética de um jovem senhor.
Imagino se o poeta escrevesse
Somente épicos arrebatadores.
O que seria da nossa futilidade,
Apatia, mesmice e insignificância?
O equilíbrio de uma lesma
E de um passarinho
É a indiferença
Entre
Ambos.
Não sabem que morrerão.
Mas o poeta palpa a nuca.
Sente a semente
De mostarda.
terça-feira, 18 de agosto de 2015
Você teria de gostar muito
Mas muito, muito mesmo
De poesia pra ficar
Comigo.
Não tenho outra voz.
Não tenho outros olhos.
Mas tenho um batalhão
De corações. Portanto,
A porta fica logo ali.
Cuidado com a mesinha de centro.
É de vidro e a quina é cortante.
Sinistro.
Por duas vezes
Escapei que cortasse
A artéria do meu joelho.
Mas muito, muito mesmo
De poesia pra ficar
Comigo.
Não tenho outra voz.
Não tenho outros olhos.
Mas tenho um batalhão
De corações. Portanto,
A porta fica logo ali.
Cuidado com a mesinha de centro.
É de vidro e a quina é cortante.
Sinistro.
Por duas vezes
Escapei que cortasse
A artéria do meu joelho.
Lembro-me de tudo
Quando tinha três anos.
A cor da parede
Da cozinha.
A cor das
Janelas.
Lembro-me de tudo.
Da comida. Do cheiro
Da papa e do arroz.
Lembro-me da queda.
Do iodo. Do furúnculo
No joelho.
Lembro-me do berço.
Do quarto nos fundos.
Da janela. Da altura.
Da chuva forte.
Lembro-me de tudo
Quando tinha três anos.
Lembro-me dos sonhos.
Das assombrações. Do
Fantasma de chapelão.
Lembro-me das mortes no grotão.
Da briga de facas. Do homem
Sangrando (da sua morte
Depois).
Lembro-me das flores.
Das toalhas engomadas.
Da tapioca e das nuvens.
Lembro-me de tudo
Quando tinha três anos.
Lembro-me das batidas do meu coração
Quando a minha prima chegava pra
Pegar-me nos braços.
Lembro-me dos sinais
Do seu pescoço.
Lembro-me
Do seu vestido.
Lembro-me
Do amor.
Quando tinha três anos.
A cor da parede
Da cozinha.
A cor das
Janelas.
Lembro-me de tudo.
Da comida. Do cheiro
Da papa e do arroz.
Lembro-me da queda.
Do iodo. Do furúnculo
No joelho.
Lembro-me do berço.
Do quarto nos fundos.
Da janela. Da altura.
Da chuva forte.
Lembro-me de tudo
Quando tinha três anos.
Lembro-me dos sonhos.
Das assombrações. Do
Fantasma de chapelão.
Lembro-me das mortes no grotão.
Da briga de facas. Do homem
Sangrando (da sua morte
Depois).
Lembro-me das flores.
Das toalhas engomadas.
Da tapioca e das nuvens.
Lembro-me de tudo
Quando tinha três anos.
Lembro-me das batidas do meu coração
Quando a minha prima chegava pra
Pegar-me nos braços.
Lembro-me dos sinais
Do seu pescoço.
Lembro-me
Do seu vestido.
Lembro-me
Do amor.
Agosto é um mês de ventania no meu litoral.
O vento sopra a vela da jangada como aviso
Que vai subir a ladeira da rua até meu quarto.
A porta treme e largando-se
Dos pesos de academia
Bate contra a parede
E retorna lânguida
Depois do gozo.
Eu ergo a sobrancelha
(Escapa um riso) e deixo
Que o mundo faça música.
Corações quando quietos
De ternura e vastidão
Não se assustam.
O vento sopra a vela da jangada como aviso
Que vai subir a ladeira da rua até meu quarto.
A porta treme e largando-se
Dos pesos de academia
Bate contra a parede
E retorna lânguida
Depois do gozo.
Eu ergo a sobrancelha
(Escapa um riso) e deixo
Que o mundo faça música.
Corações quando quietos
De ternura e vastidão
Não se assustam.
Logo bem acordava (a despeito de lavar o rosto ou não)
O menino de cabelos lilases pulava da cama e saía pedindo
Beijos: "Beijo mãe, beijo pai, beijo vó..." E continuava a procissão
De pedinte de beijos descendo a ladeira do seu morro até à cidade:
"Beijo dona Maria, seu traficante cadê meu beijo?, beijo dono da botica,
Beijo seu prefeito, beijo primeira dama, beijo coveiro, beijo artistas de tv,
Beijo banqueiro, beijo mendigo, beijo palhaço, beijo mulher da janela, cadê
O meu beijo?" O menino de cabelos lilases era habilidoso em seu ofício de
Pedinte de beijos: não demorava muito tempo colhendo beijos no seu rosto.
Pontualmente antes que o sino badalasse 11h o menino subia o morro feliz.
Atravessava o jardim do quintal (mirtos e margaridas) e dentro do seu esconderijo - um alçapão que dava para um túnel - o menino ungia
Seu rosto com a lavanda da sua vó. Embolava nas mãos os beijos.
Fazia grandes e pequenas bolas de beijos.
Depois jogava em uma fornalha que subia
Uma fumaça da cor dos seus cabelos.
A cidade respirava
Os seus beijos.
O menino de cabelos lilases pulava da cama e saía pedindo
Beijos: "Beijo mãe, beijo pai, beijo vó..." E continuava a procissão
De pedinte de beijos descendo a ladeira do seu morro até à cidade:
"Beijo dona Maria, seu traficante cadê meu beijo?, beijo dono da botica,
Beijo seu prefeito, beijo primeira dama, beijo coveiro, beijo artistas de tv,
Beijo banqueiro, beijo mendigo, beijo palhaço, beijo mulher da janela, cadê
O meu beijo?" O menino de cabelos lilases era habilidoso em seu ofício de
Pedinte de beijos: não demorava muito tempo colhendo beijos no seu rosto.
Pontualmente antes que o sino badalasse 11h o menino subia o morro feliz.
Atravessava o jardim do quintal (mirtos e margaridas) e dentro do seu esconderijo - um alçapão que dava para um túnel - o menino ungia
Seu rosto com a lavanda da sua vó. Embolava nas mãos os beijos.
Fazia grandes e pequenas bolas de beijos.
Depois jogava em uma fornalha que subia
Uma fumaça da cor dos seus cabelos.
A cidade respirava
Os seus beijos.
segunda-feira, 17 de agosto de 2015
Quem levará o meu corpo?
Quem vai segurar nas argolas?
Se estiver velhinho, não pesarei mais do que 50kg.
Se morrer agora, estou com (creio) razoáveis 74kg.
Fiz as contas de quantas andorinhas e pombos
Seriam necessários pra levar meu corpo até
O cemitério do Crato.
Só quero ir voando.
Mas dentro do caixão.
Imagino meu corpo dentro do caixão de mogno
Com argolas douradas e um bando de passarinhos.
Sei que largadão em uma rede cem por cento algodão
Seria bacana e pra turminha alada bem mais logístico.
Então, resolvido:
Uma rede artesanal cem por cento algodão
Sob um doce arrebol levado pelos bicos de andorinhas
E pombos até a Chapada do Araripe na cidade do Crato.
Bata aqui na minha mão.
Fechado, passarinhos.
(Se derem pra trás
O poeta capa, hein?)
Quem vai segurar nas argolas?
Se estiver velhinho, não pesarei mais do que 50kg.
Se morrer agora, estou com (creio) razoáveis 74kg.
Fiz as contas de quantas andorinhas e pombos
Seriam necessários pra levar meu corpo até
O cemitério do Crato.
Só quero ir voando.
Mas dentro do caixão.
Imagino meu corpo dentro do caixão de mogno
Com argolas douradas e um bando de passarinhos.
Sei que largadão em uma rede cem por cento algodão
Seria bacana e pra turminha alada bem mais logístico.
Então, resolvido:
Uma rede artesanal cem por cento algodão
Sob um doce arrebol levado pelos bicos de andorinhas
E pombos até a Chapada do Araripe na cidade do Crato.
Bata aqui na minha mão.
Fechado, passarinhos.
(Se derem pra trás
O poeta capa, hein?)
domingo, 16 de agosto de 2015
Parto do princípio
Que os meus amores
Nunca mentem, portanto
Não perco a cabeça, não me embriago,
Não estiro a mão sobre o balcão de um bar
E fico dando golpes de faca entre os vãos dos dedos.
Os meus versos mais loucos e desesperados
São aqueles que trato da minha natureza reflexiva
Quando uma fresta de luz atravessa a porta e ilumina a parede.
Sempre há uma silhueta no canto da parede
Que parece com o rosto da minha avó
Ao entardecer.
Que os meus amores
Nunca mentem, portanto
Não perco a cabeça, não me embriago,
Não estiro a mão sobre o balcão de um bar
E fico dando golpes de faca entre os vãos dos dedos.
Os meus versos mais loucos e desesperados
São aqueles que trato da minha natureza reflexiva
Quando uma fresta de luz atravessa a porta e ilumina a parede.
Sempre há uma silhueta no canto da parede
Que parece com o rosto da minha avó
Ao entardecer.
sábado, 15 de agosto de 2015
Não me lembro por que simpatizei com São Bento.
Até usava em volta do meu pescoço uma medalha.
Depois que eu perdi passei a guardar
Na minha carteira (no compartimento
Das moedas) a sua oração poderosa.
Claro que posso trocar a oração poderosa
Por um ramo dos seus cílios, minha rainha.
São Bento entende
As paixões de monge.
Até usava em volta do meu pescoço uma medalha.
Depois que eu perdi passei a guardar
Na minha carteira (no compartimento
Das moedas) a sua oração poderosa.
Claro que posso trocar a oração poderosa
Por um ramo dos seus cílios, minha rainha.
São Bento entende
As paixões de monge.
sexta-feira, 14 de agosto de 2015
Não prometo eternidade
Mas darei um jeito de convencer
Os deuses dos objetos e das aparições
Pra que não ousem apagar do seu lençol
O meu cheiro e do seu celular minhas digitais.
A minha voz será fácil de ouvir, baby:
Prenda sua respiração por um minuto.
O prazer da quase morte
Sou eu aos seus ouvidos.
Mas darei um jeito de convencer
Os deuses dos objetos e das aparições
Pra que não ousem apagar do seu lençol
O meu cheiro e do seu celular minhas digitais.
A minha voz será fácil de ouvir, baby:
Prenda sua respiração por um minuto.
O prazer da quase morte
Sou eu aos seus ouvidos.
Antes que eu morra
Darei meus sinais
De nascença.
E você levará, baby,
Dentro da sua bolsa
As minhas cicatrizes.
Os regalos da vida
Não duram um segundo
Se a natureza de quem atravessa o rio
É sempre deixar partes nas duas margens.
Navio que se perde em alto mar
Sem nunca haver conhecido
Um naufrágio de perto.
Darei meus sinais
De nascença.
E você levará, baby,
Dentro da sua bolsa
As minhas cicatrizes.
Os regalos da vida
Não duram um segundo
Se a natureza de quem atravessa o rio
É sempre deixar partes nas duas margens.
Navio que se perde em alto mar
Sem nunca haver conhecido
Um naufrágio de perto.
Nem sempre você
Pode falar comigo.
Mandar-me um beijo.
Ler meu último poema.
Nem sempre.
Deve ser muito constrangedor
Para uma mulher de negócios
Ter o poeta lhe beijando os pés
Enquanto uma comitiva de chineses
Espera na antessala pra assinar
O contrato.
Quero
10%.
Não se esqueça da minha ideia
Sobre a bioenergia oceânica através
Das caudas dos cavalos-marinhos solitários.
Pode falar comigo.
Mandar-me um beijo.
Ler meu último poema.
Nem sempre.
Deve ser muito constrangedor
Para uma mulher de negócios
Ter o poeta lhe beijando os pés
Enquanto uma comitiva de chineses
Espera na antessala pra assinar
O contrato.
Quero
10%.
Não se esqueça da minha ideia
Sobre a bioenergia oceânica através
Das caudas dos cavalos-marinhos solitários.
quinta-feira, 13 de agosto de 2015
Depois que o poeta conquista uma mulher
Só espera o dia de cortar o pulso desenhando cobrinhas
Com a lâmina enferrujada do seu primeiro barbeador. Creio
Que já desenhei algumas cobrinhas duas ou três vezes na vida.
E trocaram tão rápido de pele essas cobrinhas
Que sequer deu tempo de pingar sangue
Sobre as palavras.
Só espera o dia de cortar o pulso desenhando cobrinhas
Com a lâmina enferrujada do seu primeiro barbeador. Creio
Que já desenhei algumas cobrinhas duas ou três vezes na vida.
E trocaram tão rápido de pele essas cobrinhas
Que sequer deu tempo de pingar sangue
Sobre as palavras.
Li muita poesia na minha vida. Ah, li, baby.
Mal pisava os canteiros da praça de minha infância
Os passarinhos fugiam das árvores de oiti decepcionados
Com o poeta que passava o dia inteiro no banco de cimento
Devorando poesia.
Mas isso foi na mocidade.
Hoje em dia, só escrevo.
Escrevo sob demência uma tal demência
Que me impede a lucidez necessária
Para devotar os meus olhos
Às letrinhas de formiga.
Claro que ainda guardo
Um original de bar do Bukowski
E uma longa reflexão de Ezra Pound.
Sempre é bom
Um ou outro salmo
Nessas horas de silêncio.
Mal pisava os canteiros da praça de minha infância
Os passarinhos fugiam das árvores de oiti decepcionados
Com o poeta que passava o dia inteiro no banco de cimento
Devorando poesia.
Mas isso foi na mocidade.
Hoje em dia, só escrevo.
Escrevo sob demência uma tal demência
Que me impede a lucidez necessária
Para devotar os meus olhos
Às letrinhas de formiga.
Claro que ainda guardo
Um original de bar do Bukowski
E uma longa reflexão de Ezra Pound.
Sempre é bom
Um ou outro salmo
Nessas horas de silêncio.
terça-feira, 11 de agosto de 2015
Aquele ferro de engomar antigo
(Em que ardiam brasas dentro do ventre)
De bico pra cima olhando o telhado da sala de jantar.
A minha vó passando a língua na ponta do dedo
E encostando o dedo na planta do ferro
Pra ver se estava quente.
As camisas e calças de linho
Do meu avô - quase todas,
Ou melhor, todas
Brancas.
E eu meninote distraído
Atento, perdido em sonhos
Entre olhar amoroso a minha vó
E admirar aquele céu azul do quintal.
Erguendo-se através do muro
Os anjos da guarda e as cruzes
Dos jazigos do cemitério da cidade.
O meu coração
Já escrevia
Versos.
E a criança chorava
Sem saber por quê.
(Em que ardiam brasas dentro do ventre)
De bico pra cima olhando o telhado da sala de jantar.
A minha vó passando a língua na ponta do dedo
E encostando o dedo na planta do ferro
Pra ver se estava quente.
As camisas e calças de linho
Do meu avô - quase todas,
Ou melhor, todas
Brancas.
E eu meninote distraído
Atento, perdido em sonhos
Entre olhar amoroso a minha vó
E admirar aquele céu azul do quintal.
Erguendo-se através do muro
Os anjos da guarda e as cruzes
Dos jazigos do cemitério da cidade.
O meu coração
Já escrevia
Versos.
E a criança chorava
Sem saber por quê.
Com grana, muita grana
Você pode estalar os dedos
E algumas mulheres desmaiarem
Aos seus pés, mas aí é fingimento.
Desmaio gracioso, meu filho
É aquele em que uma mulher ao ler
Um poema suspira tão desordenadamente
Que perde o rumo de casa e procura um batom na bolsa.
Sem que você saiba.
(Nem as amigas dela)
Você pode estalar os dedos
E algumas mulheres desmaiarem
Aos seus pés, mas aí é fingimento.
Desmaio gracioso, meu filho
É aquele em que uma mulher ao ler
Um poema suspira tão desordenadamente
Que perde o rumo de casa e procura um batom na bolsa.
Sem que você saiba.
(Nem as amigas dela)
I
O meu santo
Não bateu
Com o
Teu.
Mas nem por isso
Detesto a tua poesia.
Afinal, poemas
Bem escritos
Pairam
Acima das mãos
Do canalha que
Escreveu.
*bilhete que um poeta francês recebeu de um poeta inglês.
II
O meu santo
Também não
Bateu com o teu.
E ainda que nossos santos
Não se odiassem, juro,
Meu caro, que atearia
Fogo ao teu escrito
Chegasse às
Minhas
Mãos.
*bilhete devolvido pelo poeta francês ao poeta inglês.
O meu santo
Não bateu
Com o
Teu.
Mas nem por isso
Detesto a tua poesia.
Afinal, poemas
Bem escritos
Pairam
Acima das mãos
Do canalha que
Escreveu.
*bilhete que um poeta francês recebeu de um poeta inglês.
II
O meu santo
Também não
Bateu com o teu.
E ainda que nossos santos
Não se odiassem, juro,
Meu caro, que atearia
Fogo ao teu escrito
Chegasse às
Minhas
Mãos.
*bilhete devolvido pelo poeta francês ao poeta inglês.
O que guardo de mais valioso
Dentro do baú antigo da minha vó
Não é um livrinho de alquimia de capa
Azul, letras doiradas e costurado com
Hastes de lírios. Não é não. Mas, sim,
O Semancol: um vidrinho frágil de botica
De cujo líquido pingo três gotinhas na língua.
E sumo.
Claro, com muita elegância.
Ainda enviando flores e beijos.
Dentro do baú antigo da minha vó
Não é um livrinho de alquimia de capa
Azul, letras doiradas e costurado com
Hastes de lírios. Não é não. Mas, sim,
O Semancol: um vidrinho frágil de botica
De cujo líquido pingo três gotinhas na língua.
E sumo.
Claro, com muita elegância.
Ainda enviando flores e beijos.
Só acredito na mulher
Que bate à minha porta
E pede-me emprestado
Um livro ou uma xícara
De açúcar ou café.
Machado de Assis
Tão lúgubre com a morte
Da sua amada. Se tivesse
Uma vizinha do segundo andar
A lhe oferecer um pratinho de salgados
Talvez se esqueceria do seu grande amor.
Pelo menos, durante o intervalo
De pegar um quitute e levá-lo à boca.
Que bate à minha porta
E pede-me emprestado
Um livro ou uma xícara
De açúcar ou café.
Machado de Assis
Tão lúgubre com a morte
Da sua amada. Se tivesse
Uma vizinha do segundo andar
A lhe oferecer um pratinho de salgados
Talvez se esqueceria do seu grande amor.
Pelo menos, durante o intervalo
De pegar um quitute e levá-lo à boca.
segunda-feira, 10 de agosto de 2015
Não me chames de querido nem de fofo.
Nem beijes meu coração. Eu não mereço
Tamanha docilidade e imensa misericórdia.
Carrega logo o meu cadáver
Pelas montanhas do Curdistão
E sepulta a minha esperança órfã.
Finca uma bandeira
Sobre a minha cova.
Que dos céus os anjos se glorifiquem
E dos infernos os outros anjos
Façam o mesmo:
Toquem banjo.
Nem beijes meu coração. Eu não mereço
Tamanha docilidade e imensa misericórdia.
Carrega logo o meu cadáver
Pelas montanhas do Curdistão
E sepulta a minha esperança órfã.
Finca uma bandeira
Sobre a minha cova.
Que dos céus os anjos se glorifiquem
E dos infernos os outros anjos
Façam o mesmo:
Toquem banjo.
domingo, 9 de agosto de 2015
Você entrou no inferno porque quis.
A chave continua em suas mãos.
Se quiser sair, abra a porta.
O mal não terá força
Contra a sua vontade.
Agora se você adora confusão,
Barulho, balbúrdia, entorpecimento,
Avidez, loucura, contrição, desfalecimento.
Então a sua alma é infernal.
E não existe dor em seu peito.
Você ama o que deseja.
Assim que é, meu caro.
Sem sombras
De dúvida.
E sem
Ameaças.
A chave continua em suas mãos.
Se quiser sair, abra a porta.
O mal não terá força
Contra a sua vontade.
Agora se você adora confusão,
Barulho, balbúrdia, entorpecimento,
Avidez, loucura, contrição, desfalecimento.
Então a sua alma é infernal.
E não existe dor em seu peito.
Você ama o que deseja.
Assim que é, meu caro.
Sem sombras
De dúvida.
E sem
Ameaças.
Guardo um estojo de mãos.
Ninguém sabe. Um estojo.
Mãos miúdas. Enormes.
Todas com penas e canetas.
Quando me bate um cansaço.
Assobio e as mãos saem da gaveta.
Caminham até a mesa redonda de vidro.
Começam a escrever poemas sem piedade.
Penso em usar dessa técnica
Quando estiver morto na cova.
Já disse antes que escreveria versos
Mesmo morto. Mas agora digo
Com mais coerência.
Ninguém sabe. Um estojo.
Mãos miúdas. Enormes.
Todas com penas e canetas.
Quando me bate um cansaço.
Assobio e as mãos saem da gaveta.
Caminham até a mesa redonda de vidro.
Começam a escrever poemas sem piedade.
Penso em usar dessa técnica
Quando estiver morto na cova.
Já disse antes que escreveria versos
Mesmo morto. Mas agora digo
Com mais coerência.
O caçador talvez pense na primeira namorada
Depois de fazer o fogo, pegar a caça pelas orelhas
Grandes e enormes - um roedor amarelo das estepes.
Os seus assovios apesar da tempestade
(De pingos fortes e vento forte na floresta)
São ouvidos pelos pássaros tão silenciosos.
O caçador talvez pense no seu primeiro amor
Sangrando aquele animal peludo de orelhas grandes.
Mas é hora do último golpe abaixo do ventre do mamífero.
O sangue cai em uma bacia de alumínio.
Enche a bacia de alumínio. O caçador
Fecha a porta da varanda.
Entra no seu chalé ainda assoviando sem tirar
Por um minuto do coração o seu primeiro amor.
Que por sinal,
Usava tranças.
Depois de fazer o fogo, pegar a caça pelas orelhas
Grandes e enormes - um roedor amarelo das estepes.
Os seus assovios apesar da tempestade
(De pingos fortes e vento forte na floresta)
São ouvidos pelos pássaros tão silenciosos.
O caçador talvez pense no seu primeiro amor
Sangrando aquele animal peludo de orelhas grandes.
Mas é hora do último golpe abaixo do ventre do mamífero.
O sangue cai em uma bacia de alumínio.
Enche a bacia de alumínio. O caçador
Fecha a porta da varanda.
Entra no seu chalé ainda assoviando sem tirar
Por um minuto do coração o seu primeiro amor.
Que por sinal,
Usava tranças.
A poesia não me deu dinheiro. Fama. Isenção.
Só algumas mulheres (em sua maioria loucas).
Graças a deus.
Uma tatuagem de marinheiro
No braço com fuligem e sangue.
Não sinto nenhuma elevação humana.
Também não há ódio de morte por não
Acender velas a ídolos nem jogar moedas.
Claro que é o meu umbigo.
Haveria de ser, ora bolas.
(Um egoísmo básico
De xamã trôpego)
Coisa de dar três passos pra frente
E dois pra trás a cavar o próprio buraco.
Gargalho pela estúpida segurança
Em saber que os meus ossos
Já se encontram separados
Em uma gaveta.
Não devo razão ao outro
Mas devo ao coração
Coragem, filho.
A minha morte será limpa.
Só algumas mulheres (em sua maioria loucas).
Graças a deus.
Uma tatuagem de marinheiro
No braço com fuligem e sangue.
Não sinto nenhuma elevação humana.
Também não há ódio de morte por não
Acender velas a ídolos nem jogar moedas.
Claro que é o meu umbigo.
Haveria de ser, ora bolas.
(Um egoísmo básico
De xamã trôpego)
Coisa de dar três passos pra frente
E dois pra trás a cavar o próprio buraco.
Gargalho pela estúpida segurança
Em saber que os meus ossos
Já se encontram separados
Em uma gaveta.
Não devo razão ao outro
Mas devo ao coração
Coragem, filho.
A minha morte será limpa.
sábado, 8 de agosto de 2015
I
Uma pessoa basta
Que te traga na alma
(Duas ou mais embriagam)
E tu colherás botões de girassóis
Mendigando do vento as pegadas.
Depois de apontar o revólver
A tua sombra não se moverá.
II
Havemos de amar
A nossa natureza, ainda que
Aborreça nossas manhãs de sábado.
E no lugar do abraço,
Pensemos em saudade.
Uma pessoa basta
Que te traga na alma
(Duas ou mais embriagam)
E tu colherás botões de girassóis
Mendigando do vento as pegadas.
Depois de apontar o revólver
A tua sombra não se moverá.
II
Havemos de amar
A nossa natureza, ainda que
Aborreça nossas manhãs de sábado.
E no lugar do abraço,
Pensemos em saudade.
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