segunda-feira, 11 de março de 2013

o coxo

Mais uma noite sem dormir andando pela casa de muleta
feito um monge a pagar pelos pecados da juventude.

Até os fantasmas se compadeceram
do meu patético estado e me fizeram
companhia relembrando velhos tempos

em que eu os prendia no guarda-roupa
 a torturá-los sem piedade.

Veja só, querida.
Hoje são eles que me aliviam
dessa solidão terrível de tendões inflamados.

Se houvesse ópio na casa
eu encheria minha alma
mas no meu quarto
só há versos.

Alguns já velhinhos de bengala bebendo
seu chazinho e seus biscoitos de gergelim.

Os meus fantasmas nunca mais vou prendê-los
dentro do guarda-roupa ou debaixo da cama.

Foram justamente os meus fantasmas
nessas duas noites seguidas de sofrimento
que me deram a mão e passearam comigo.

Na cozinha de madrugada
as baratas pensam que o reino é delas.

Mas como matá-las
caxingando sem forças
sequer pra segurar um copo d'água?

Aliás, foi uma fantasminha interessante
que me levou o copo à boca e me disse:
"bebe, mocinho, e não se esquece
do seu comprimido, hein?"

Quando eu morrer, querida,
vou me casar com essa fantasminha.


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