segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

lázaro e o molusco

Interessante eu nunca ter catado pedrinhas na praia
só me interessavam búzios talvez
por eu saber que um dia

dentro deles
viveram moluscos

e moluscos têm a mesma vida dos homens:
sonham com o mar dentro dos ouvidos
e temem horrorizados quando
são arrastados às falésias.

Eu fui um poeta a partir da noite
quando sozinho pela praia
colhi um búzio

e ao levá-lo
ao ouvido

não foram apenas ondas
e gracejos de cavalos-marinhos.

Eu ouvi o próprio molusco
ressuscitando a mínima parte
que lhe havia restado dentro do búzio.

E eu [que quase medo tenho de nada]
deixei que o molusco ainda meio
amputado do abdome

invadisse meu ouvido,
descesse não sei por qual via
até o meu coração e lá se plantasse
e lá se iniciasse a regeneração de cada molécula.

Sempre que estou sozinho no meu quarto
ou dentro do banheiro eu faço concha
com as mãos e não ouço ondas
ou gracejos dos cavalos-marinhos -

eu ouço claramente
os assobios do molusco
em forma de agradecimento.

Loucura minha mas é como se ele
o molusco ao qual dei vida

confessasse que eu sou
um rei, um maltrapilho
mas um rei.

Um comentário:

  1. Repito: minhas reverências! difícil de ver uma poesia tão original e surpreendente quanto a sua... beijo, bruxo.

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