sábado, 14 de janeiro de 2012

histeria

Que a gargalhada pertença ao outro.
Que o meu sorriso só se divida
entre a leve ponta do canino
e o frio lábio.

Doem meus ouvidos as gargalhadas
de quem não finge tão bem.

Uma boa gargalhada
não deve ter motivos.

Deve ser trêmula,
aterrorizante.

Uma coruja gargalha
quando pia sobre
a igreja.

E as andorinhas tremem
conscientes da morte.

Isso me interessa,
esse tipo de gargalhada.

Ai dos pequenos passarinhos
que hão de ouvir de perto
a gargalhada da coruja.

Depois será a vez do gavião
visitar dentro das torres
os pombos.

Pena que o gavião agora
está aflito por questões
de família.

Todos os filhotes estão bem,
obrigado, mas há aqueles
distraídos transeuntes
que teimam passear
debaixo do ninho.

E há os loucos
que ainda gargalham.

Inclusive alguns pombos
que ingênuos ou incrédulos
procuram comida nos canteiros.

Será que eles não percebem
que a mamãe gavião
está no seu limite?

Voltem para dentro da torre.
Deem um tempo.

Cansei de assistir a pombos degolados.
E os seus tênis vermelhos arrancados
dos seus pés.

Não acredito que ninguém não tenha notado
que os pombos só usam tênis nike vermelho.

Já mencionei essa imagem tantas vezes.
Mas sempre me parece que digo uma mentira.

Olhem para os pés dos pombos.
Vejam seus tênis nike vermelho.

Certo dia um amigo confessou-me
que nem os pombos velhos
tiram as sapatilhas.

Eu disse que não eram sapatilhas.
Eram tênis. Depois pensei -

ora, talvez dentre eles
exista quem prefira
uma sapatilha
a um tênis.

Eu não sou um pombo.
Não como migalhas.
Não bico os olhos
das flores.

Muito menos dou voltas em torno da praça
de tênis ou sapatilhas. O meu negócio
é observá-los, a eles os pombos
e as corujas e os gaviões.

Todos na praça.
E acreditem, nessas horas
a minha gargalhada é verdadeira.

Vem do intestino,
esôfago e pulmões.

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