sábado, 21 de janeiro de 2012

o jardineiro descalço

Em anos bissextos deixo o corpo, mudo de pele,
troco o dente da frente pela sétima vértebra
e ao sorrir todo o sistema nervoso palpita.

Em anos bissextos ganho de presente
uma alma novinha em folha.

Sem linhas traçadas, sem páginas gordurosas,
sem vestígios de traças, cupins e baratas.

Tenho a chance de recuperar a moeda de dez centavos
que um dia eu perdi dentro da rachadura da parede.

Em anos bissextos posso perdoar a mim mesmo
do olhar cruel e da voz cínica que derrubaram
quem se importava comigo
e me amava.

Em anos bissextos como maçã
e ouço os pássaros

sem nenhum desejo
de rastejar sinuoso
ou voar boçal.

Em anos bissextos meus punhos inflamam,
meu coração para de bater, a mente pifa,
a língua seca, o sangue flui
e não volta.

Em anos bissextos eu morro,
eu morro de óculos,
bermudão,

os pés sobre as correias
de um velho chinelo.

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